O
meu pai era paulista; meu avô, pernambucano;
o meu bisavô, mineiro; meu tataravô, baiano;
meu maestro soberano foi Antônio Brasileiro...
Trecho da canção Paratodos, de Chico Buarque de Holanda
1. Introdução
A poeta goiana Cora Coralina dizia que sua avó não falava “errado”, falava “no antigo”. Queria dizer com isso que ela tinha um jeito de falar comum
naquele tempo e naquele lugar. E assim é. Cada lugar, cada época, cada situação, cada grupo social, cada finalidade comunicativa guarda características particulares. A essas diferenças na forma de se comunicar dá-se o nome de níveis de linguagem,
ou seja, uma imensa diversidade de registros da experiência linguística. Daí a dificuldade de se falar em erro e acerto quando se trata de comunicação, pois tudo dependerá do objetivo e do contexto em que se processa o fenômeno comunicativo.
Se o sujeito se encontra em ambiente descontraído, conversando com amigos, em público, naturalmente se comunicará de forma despreocupada, usará gírias comuns ao seu grupo de colegas, contará piadas etc, pois trata-se de um contexto informal. Já se ele estiver em reunião de trabalho na empresa em que presta serviços, ou fazendo palestra sobre um assunto técnico, ou lendo um discurso em uma solenidade, usará, logicamente, outro vocabulário, outra postura, outra linguagem, mais formal, mais preocupada com a correção no uso do idioma. Assim também na escrita. Se o indivíduo escreve uma carta pessoal, ele o faz de maneira mais solta e descomplicada. Se, no entanto, redige um parecer para um processo judicial ou uma redação de vestibular, usa de linguagem mais elaborada.
Mas não só. Se o indivíduo pertence a um grupo caracterizado pela formação intelectual acadêmica, espera-se dele domínio de formas comunicativas mais próximas da gramática oficial. No entanto, se se trata de um homem do campo, com experiência de vida voltada para o cultivo da terra, e que, infelizmente, não teve oportunidade de aprender a ler e a escrever, obviamente, não se pode cobrar dele o uso de linguagem urbana, formalista ou protocolar, mas deve-se sim entender que, dentro de seu universo, a sua forma peculiar de expressar-se é pertinente, perfeitamente adequada à sua realidade.
Portanto, sempre que se tratar de formas de comunicação verbal, não há que se falar em “certo” ou “errado”, mas sim em “adequado” ou “inadequado” a determinados contextos da vida prática.
Se o sujeito se encontra em ambiente descontraído, conversando com amigos, em público, naturalmente se comunicará de forma despreocupada, usará gírias comuns ao seu grupo de colegas, contará piadas etc, pois trata-se de um contexto informal. Já se ele estiver em reunião de trabalho na empresa em que presta serviços, ou fazendo palestra sobre um assunto técnico, ou lendo um discurso em uma solenidade, usará, logicamente, outro vocabulário, outra postura, outra linguagem, mais formal, mais preocupada com a correção no uso do idioma. Assim também na escrita. Se o indivíduo escreve uma carta pessoal, ele o faz de maneira mais solta e descomplicada. Se, no entanto, redige um parecer para um processo judicial ou uma redação de vestibular, usa de linguagem mais elaborada.
Mas não só. Se o indivíduo pertence a um grupo caracterizado pela formação intelectual acadêmica, espera-se dele domínio de formas comunicativas mais próximas da gramática oficial. No entanto, se se trata de um homem do campo, com experiência de vida voltada para o cultivo da terra, e que, infelizmente, não teve oportunidade de aprender a ler e a escrever, obviamente, não se pode cobrar dele o uso de linguagem urbana, formalista ou protocolar, mas deve-se sim entender que, dentro de seu universo, a sua forma peculiar de expressar-se é pertinente, perfeitamente adequada à sua realidade.
Portanto, sempre que se tratar de formas de comunicação verbal, não há que se falar em “certo” ou “errado”, mas sim em “adequado” ou “inadequado” a determinados contextos da vida prática.
2. Diferentes registros de linguagem
2.1. Norma-padrão, linguagem formal ou norma
Trata-se do idioma usado segundo os preceitos da gramática oficial de um país. Em geral, só se usa a norma culta, realmente, com seus rigores, na linguagem escrita formal, ou seja, em textos “sérios”, como as redações de vestibular, as teses acadêmicas, os pareceres técnicos, as redações forenses, os textos referenciais jornalísticos ou pedagógicos
etc. É importante lembrar assim que, no uso da norma culta, não são toleradas as gírias, os neologismos, os coloquia- lismos
ou regionalismos, nem os estrangeirismos, isto é, deve-se usar a língua em sua forma “pasteurizada”, gramaticalmente pura, livre das variantes da linguagem informal operada no dia a dia.
Exemplo
A
verdadeira compreensão nas
relações humanas exige a paciente identificação e desconstrução das facetas de nossas suposições implícitas que distorcem a realidade do outro. Isso pode
acontecer quando começamos a ver
claramente nossas próprias peculiaridades como fatos sobre nós, e não simplesmente como
características implícitas à condição humana em geral.
Trecho
retirado do artigo A distorção objetiva dasculturas,
de Charles Taylor, publicado no jornal FSP
2.2. Registro técnico, científico ou terminológico
É a linguagem usada apenas por profissionais de uma determinada área do conhecimento. Trata-se, na verdade, de uma especificidade da norma-padrão ou culta, uma vez que não prescinde do cuidado gramatical. Todavia, compõe-se de um universo de palavras próprias do cotidiano de um grupo de profissionais ou estudiosos de uma dada área do saber. Daí falar-se na linguagem dos advogados, dos médicos, dos filósofos etc. Cada ciência tem seu vocabulário, sua terminologia particular, seus sentidos e significados únicos e preciosos.
É a linguagem usada apenas por profissionais de uma determinada área do conhecimento. Trata-se, na verdade, de uma especificidade da norma-padrão ou culta, uma vez que não prescinde do cuidado gramatical. Todavia, compõe-se de um universo de palavras próprias do cotidiano de um grupo de profissionais ou estudiosos de uma dada área do saber. Daí falar-se na linguagem dos advogados, dos médicos, dos filósofos etc. Cada ciência tem seu vocabulário, sua terminologia particular, seus sentidos e significados únicos e preciosos.
Exemplo
Informação técnica
CELESTAMINE reúne o efeito anti-inflamatório e antialérgico da betametasona e a ação anti-histamínica
do maleato de dexclorfeniramina. O uso combinado da betametasona e do maleato de dexclorfeniramina permite a utilização de doses menores de corticosteroides com resultados semelhantes aos obtidos com doses mais altas de corticoide isoladamente.
A betametasona é um derivado sintético da prednisolona, demonstrando potente efeito anti-inflamatório com o uso de
baixas dosagens e eliminação de certos efeitos adversos in-
desejáveis, como retenção anormal de sal e água e excessiva
excreção de potássio, na maioria dos pacientes que recebem
doses terapêuticas habituais.
2.3. Registro coloquial ou informal
É a língua das ruas, o
idioma falado por todos no cotidiano, com
suas variantes e particularidades fonéticas. Enquanto na norma culta se diz “dá-me um lenço” ou “nós estamos cansados”,
na linguagem
coloquial se diz “mi dá um lenço” ou “a gente tá cansado”. É a linguagem em que cabem as gírias, os clichês e a plena liberdade no uso do idioma. E além de ser a forma empregada pelas pessoas na rotina das relações, pode ser encontrada também nos chamados discursos diretos das narrativas, ou seja, na trans crição literal das
falas de
personagens, quando
o
autor quer transmitir realismo na criação de determinadas cenas e contextos.
Exemplo
... a gente tá cansado de tudo isso que está aí. Os políticos acha que a gente é bobo, que a gente não sabe o que qué. Mas eles tão enganado, o povo é mais veiaco do que eles pensa. Vai
chegá o dia da
virada, aí eu quero vê
porque o mundo é
redondo, dá muita volta, e nada como um dia atrais do outro...
Depoimento
de um cidadão tomado na Praça da Sé, em São Paulo, 2007
2.4. Registro regionalista
Trata-se de uma variante do nível coloquial. É a
particular maneira de expressar-se de um grupo de pessoas, em um dado local, e em determinada época, com suas peculiaridades e traços, em geral, pitorescos por suas variantes principalmente semânticas (relativas ao significado ímpar de algumas palavras em dadas regiões, como, por exemplo, “bicha”, que em Portugal significa fila). Daí falar-se da “bicha muito grande” ou da conhecida raiz brasileira “mandioca”, que, a depender dos usos regionais, pode ser conhecida como “aipim” ou “macacheira”.
Exemplo
Prendi co’ela qui o chá da frô do sabuguero é pas febre de sarampo. Já pas criança que tá co pobrema di mar no imbigo, qu’êis fala mar de sete dia, fais o chá cum foi de laranjera,
pinga treis pingo de vela e treis gota do ói de capaúva, ess’ ói dá num mato, é tirado do pau da arve
do
ói de capaúva, aí fais o imprasto e põe no imbigo da criança. É tomá e cortá.
Tem tomém a carobinha
do campo prás pessoa que dá muita ferida, peg’ aquêis ramo e mais o sabão gentir, qu’é um cipó
que
dá no mato, ess’ é pá fazê bãe, ô nem num sei s’ inxistemais, por causo de que já fais muitos ano cô saí da fazenda, já num inxiste mais as mata, já roçô tudo, já cabô cum tudo.
Do livro Ruínas da vila antiga – André Bordini, Atlas, 2002
3. A gíria e
o registro coloquial da linguagem
Muitas vezes, as gírias são a mudança no sentido original de palavras da língua-padrão. Observe, por exemplo, o
que ocorre com a expressão “sangue bom”: no sentido próprio, significa o estado do sangue de uma pessoa que está sem doença, sem contaminação; na gíria, indica um tipo de pessoa, uma pessoa de boa índole, legal.
Leia o texto de um professor de educação física:
É importante que a gente faça a maromba, que a gente utilize o trabalho de maromba que é pro corpo ficar sarado,
pra que a gente possa ficar casca grossa. O que quer dizer? Caído significa o corpo fraco. A maromba é um sentido figurado do marombeiro que puxava a balsa para atravessar duma margem pra outra do rio.
Então, o marombeiro é aquele indivíduo que fez força, que tá atrelado ao trabalho de força.
O casca grossa é no sentido rude, do resistente, do forte que sofre. Tem um sofrimento, que suporta o sofrimento.
A explicação que o professor de ginástica deu pode ser estendida e aplicada a todos os vocábulos que usamos. Não é apenas no mundo da ginástica que acontece de os vocábulos terem seu sentido modificado.
Vocabulário
Marombeiro
1) homem que puxava a balsa
2) homem que malha na academia
Casca grossa
1) casca grossa e resistente de um vegetal
2) homem resistente
Nenhum comentário:
Postar um comentário